Fisioterapia Respiratória nas Cirurgias Cardíacas Pediátricas

As cardiopatias são os defeitos congênitos mais comuns no nascimento, acometendo de 8 a 10 crianças a cada 1.000 nascidos vivos. Anualmente, as estimativas em todo o Brasil, são de aproximadamente 28 mil novos casos de cardiopatias, sendo estimado que são necessárias no mesmo período 23 mil procedimentos cirúrgicos para a correção de defeitos congênitos. As alterações mais comuns que precisam de cirurgia são a tetralogia de Fallot, estenose valvar pulmonar, transposição dos grandes vasos ou das grandes artérias (TGA), persistência do canal arterial (PCA), coartação da aorta, comunicação interauricular (CIA) ou interventricular (CIV).

As causas de morbidade e mortalidade nas cirurgias cardíacas em adultos já foram definidas, sendo elas as complicações pulmonares. Os dados referentes as cirurgias pediátricas ainda estão indefinidas, sendo as mais comuns alterações da mecânicas respiratória, principalmente se as cirurgias forem associadas a circulação extracorpórea (CEC). Só é sabido que quanto mais precoce for a cirurgia, menos sequelas físicas e psicológicas a criança terá. As cirurgias cardíacas pediátricas atualmente têm um universo próprio, envolvendo a integração entre dados clínicos, os avanços tecnológicos e o desenvolvimento de novas técnicas. Buscando resultados mais efetivos e menos agressivos para as crianças.

A atuação de uma equipe multidisciplinar nos períodos pré, peri e pós-operatório tem sido cada vez mais utilizado, nessa a equipe o fisioterapeuta tem sido muito solicitado para melhorar o quadro clínico do paciente, prevenir e recuperar complicações pulmonares, auxiliar na reabilitação social, reduzir os efeitos deletérios provenientes da cirurgia e da restrição ao leito.

As principais complicações pulmonares no pós-cirúrgico pediátrico são: atelectasia, pneumonia, derrame pleural, pneumotórax, quilotórax, hipertensão pulmonar, hemorragia pulmonar e paralisa diafragmática, sendo as duas primeiras as mais frequentes.

A atelectasia é definida como um colapso alveolar em uma região do parênquima pulmonar, piorando a oxigenação, diminuindo a complacência pulmonar, provoca inibição da tosse e do clerance pulmonar. Pode levar a insuficiência e aumentar a resistência vascular pulmonar.

A pneumonia é uma das causas mais frequentes de infecção nosocomial no pós-operatório de cirurgia cardíaca pediátrica, sendo considerada uma causa importante de morbimortalidade nessa população.

As cirurgias cardíacas que são associadas à CEC, tem como efeito o aumento da permeabilidade capilar gerando edema, o que leva a diminuição da complacência pulmonar e da área de trocas gasosas, também leva ao colabamento das vias aéreas, diminuição da capacidade residual funcional e hipoxemia.

Alguns estudos apontam os seguintes benefícios da atuação da fisioterapia: melhora da oxigenação, preservação de condições satisfatórias de ventilação pulmonar, manutenção da permeabilidade das vias aéreas, melhora do volume expiratório, da complacência e resistência pulmonar, além da diminuição do tempo de permanência nos centros de terapia intensiva (CTI), auxílio na deambulação precoce e redução do tempo de internação hospitalar.

Para que o fisioterapeuta eleja a intervenção mais adequada para o paciente pediátrico, independente do período de internação, o mesmo deve ter conhecimento da fisiopatologia da cardiopatia em questão, além da compreensão da anatomia, do tipo de cirurgia (reparadora ou paliativa) e a condição clínica do paciente. Após a análise desses fatores, o fisioterapeuta consegue selecionar as abordagens mais efetivas. Dependendo da cardiopatia os cuidados durante o manejo fisioterapêutico irão mudar, já que cada intervenção e a condição clínica do paciente são fatores de risco que resultam em diferentes variáveis para uma ação bem sucedida.

Autora:

Anna Victoria Ribeiro

Anna Vitoria Ribeiro – Acad. Fisioterapia UNIFESO

 

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Avaliação do transporte neonatal

Resenha Crítica: REFERÊNCIA: Romanzeira JC, Sarinho SW. Quality Assessment of Neonatal Transport performed by the Mobile Emergency Medical Services (Samu). J Pediatr (Rio J). 2015;91:380-5.

O objetivo do estudo avaliar a qualidade do transporte realizado pelo SAMU, usando como instrumento de avaliação o Trips (Transport Risk Index of Phisiologic Stabilit), avaliando as seguintes variáveis: Características dos recém-nascidos, intercorrências de aspecto médico e mecânico (das máquinas e da ambulância) e a estabilidade, antes e depois do transporte.

O estudo baseou-se na observação do antes e depois de 33 recém-nascidos, sendo 57,6% do sexo masculino, 63,6% nascidos a termo, 39,4% com peso ao nascer abaixo de 2.500g e tendo como causa para solicitação a insuficiência respiratória em 42,4% dos casos. A duração média do transporte foi de 58 minutos.

Apesar de desde 1990 já haverem estudos demonstrando a importância da transferência neonatal sobre desfechos importantes como mortalidade e morbidade perinatal, ainda há uma escassez de estudos sobre o assunto.

Em 2011, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), publicou um manual e um curso voltado para o transporte neonatal, no qual, dentre outros fatores, constava a estabilização do recém-nascido como um dos pontos relacionados a segurança do transporte. Além disso, conceitua-se como objetivo do transporte a manutenção ou, até mesmo, melhoria das condições gerais quando o paciente adentrar a unidade de destino.

Marba , Guinsburg, Almeida, Nader, Vieira, Ramos, et al. Transporte de
recém-nascido de alto risco: diretrizes da Sociedade Brasileira de
Pediatria 2011.

É importante notar que, tanto fatores independentes ao transporte (status de gravidade pré-transporte, idade gestacional, peso e uso de drogas vasoativas) como fatores diretamente relacionados (vibrações, barulho excessivo e diferença de temperatura, distância e tempo de duração do transporte e condições da rodovia) interferem na manutenção da estabilidade do RN e devem ser rapidamente reconhecidos e minimizados e pela equipe responsável pelo

A fim de avaliar a qualidade do transporte e garantir sua segurança, o Ministério da Saúde recomenda o uso do Trips. Esse escore avalia os seguintes quesitos: temperatura, pressão arterial, desconforto respiratório, oximetria de pulso e estado neurológico.

Atenção à saúde do recém-nascido: guia para os profissionais de saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. – Brasília : Ministério da Saúde, 2011.

 

MÉTODOS

Foi realizado um estudo transversal analisando dois momentos: imediatamente antes e depois do transporte inter-hospitalar, em Recife, no período de março a agosto de 2013.

Para inclusão foram determinados os seguintes critérios: a) solicitação de transporte neonatal inter-hospitalar; b) ambulância do tipo UTI enviada segundo os critérios do médico regulador, com hospital de destino pré-definido pela central de leitos e com senha; c) mãe ou responsável dispor-se voluntariamente a assinar o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). Para exclusão, foram adotados os seguintes fatores: RN hemodinamicamente instável antes do transporte, refratários às medidas para sua estabilização ou transportados em decorrência de atendimento pré-hospitalar (serviço de resgate).

As variáveis consideradas no estudo foram: dados do RN (idade gestacional, gênero, tipo de parto, idade no momento do transporte, peso ao nascer e no momento do transporte, diagnóstico principal e motivo da transferência), dados relacionados a avaliação pré e pós transporte (estabilidade hemodinâmica, suporte ventilatório e escore Trips), análise de intercorrências médicas e mecânicas (máquinas e ambulância).

Foi realizada a coleta de dados através do prontuário eletrônico do SAMU, a ficha de encaminhamento do paciente e a ficha de preenchida pela equipe no momento do transporte, que havia sido treinada para padronização do escore Trips. Em seguida esses dados foram avaliados com o antes e depois do transporte e classificados em duas categorias: “aumentou” e “manteve/diminuiu”. O transporte foi considerado como de boa qualidade quando classificado em “manteve/diminuiu”.

 

RESULTADOS

Durante o período de estudos, foram solicitados 42 transportes e, após a aplicação do critério de exclusão, foram selecionados 33 RN.

Na população estudada , observou-se maior prevalência de idade gestacional de 37 e 42 semanas, menos de 7 dias de vida no momento do transporte (mediana de 1 dia de vida) e peso no momento de transporte superior a 2.500 g.

A análise de resultados mostrou que 84,8% foram classificados no grupo “manteve/diminuiu” em relação ao Trips, com igual distribuição das variáveis em relação aos grupos.

Em relação a necessidade de suporte ventilatório, o suporte invasivo foi o mais utilizado. Em relação aos sinais vitais analisados, a temperatura foi o que mais chamou atenção e estava reduzida (36,46± 0,19 para 36,08±0,22) em todos os 5 RN que demonstraram piora no escore, sugerindo ser essa a varíavel mais afetada pelo transporte inter-hospitalar. As demais variáveis (escore trips, SpO2 e PAS) mostraram-se sem alteração significativa.

 

DISCUSSÃO

Sem dúvida, podemos destacar o baixo espaço amostral da pesquisa é uma condição a ser analisada em relação a análise do transporte.

Além disso, os resultados se contrapõem aos demonstrados até então. Porém, vale observar que são considerados condições prévias do RN como prematuridade, baixo peso ao nascer, idade no momento do transporte e instabilidade são apontados como prejudicadores da qualidade do transporte. No entanto, a população estudada nessa pesquisa estava fora desses fatores, o que pode mostrar um motivo para os resultados divergirem daqueles até então citados pela literatura especializada.

O estudo reflete ainda a necessidade da estabilização do RN antes do transporte, fato esse também ressaltado pela SBP, mencionada na Diretriz de 2011. Afinal o paciente neonatal, por si só, já é extremamente lábil e o ambiente da ambulância dificulta processos invasivos como acessos e intubação, por exemplo. Por isso a recomendação que, caso seja necessário, esses procedimentos devam ser realizados antes do transporte, independente da distância a ser percorrida pela ambulância.

 

REFERÊNCIAS:

Atenção à saúde do recém-nascido: guia para os profissionais de saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. – Brasília : Ministério da Saúde, 2011. 4 v. : il. – (Série A. Normas e Manuais Técnicas)

Manual de orientações sobre o transporte neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas.– Brasília : Editora do Ministério da Saúde, 2010

 

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